“A Câmara Municipal, com uma
nobre solicitude pelo peixe, para quem parece ser uma extremosa mãe – receando,
com um carinho assustado, que o peixe se constipasse, ganhasse catarros ou
sofresse a indiscrição dos vizinhos, construi-lhe uma praça fechada, altas
paredes, varandas, gabinetes interiores, corredores, salas, alcovas, uma casa
bem reparada, quase um cárcere. E aquilo é de tal modo tranquilo, aconchegado,
confortável, velado da luz, que a câmara hesita se há-de pôr ali peixes se
livros – e se fará daquilo um mercado ou uma biblioteca!
Não queremos cravar, nesta
delicada intenção da câmara, o lusente farpão da ironia! – mas parece-nos, que
com mais alguma despesa a câmara daria ao país o exemplo de uma grande
dedicação pelo peixe! – Era mandar tapetar-lhe a praça, pôr-lhe pianos e sofás;
os robalos estariam deitados em leitos de mogno; o povo teria um tapete para se
estender! O comprador seria introduzido pelos criados num gabinete. Entregaria
o seu bilhete e pediria o «género». A peixeira conduzi-lo-ia a uma alcova, com
as janelas cerradas, ergueria os cortinados dum leito e mostraria,
inocentemente adormecidas sobre a mole doçura dos cobertores de damasco – duas
pescadinhas marmotas!
O comprador tiraria o seu chapéu
comovido.
- Suas Ex.as recolheram-se tarde:
são 80 reis cada uma!”
“In As Farpas – de Eça de Queiroz
e Ramalho Ortigão, em 1871”
P.S. - Qualquer semelhança é pura coincidência. O
Conde lembra que o Mercado Municipal sofreu uma grande intervenção de
requalificação, no mandato de Santana Lopes, ou seja, há pouco mais de uma
década. Enquanto esta obra foi executada, o Mercado funcionou, provisoriamente,
numa tenda de circo, instalada no parque das gaivotas. Presentemente, o mercado
está a funcionar numa estrutura provisória no mesmo local (parque das
gaivotas), que apenas custou trezentos mil euros. Esta nova intervenção no
Mercado, está integrado no projecto da regeneração urbana! – Sem dúvida uma
grande obra que vai trazer muito desenvolvimento à Figueira.